sexta-feira, 18 de novembro de 2011

A beleza e a degradação da Lagoa do Portinho


Lagoa do Portinho em Parnaíba
Aproveitando o feriado prolongado, uma vez que no âmbito da Justiça Estadual o Dia do Servidor Público, por necessidade de serviço, fora transferido para o dia 14 do corrente mês, atendendo desejo de Fátima, minha mulher, estive no litoral parnaibano. No sábado, pela manhã, fomos rever a deslumbrante Lagoa do Portinho, que já cantei em mais de um poema. Tendo ido morar na cidade de Parnaíba em junho de 1975, conheci-a pela primeira vez em 1977 ou 1978. Estava com o Reginaldo Costa na praia de Atalaia, quando ele propôs passarmos pela lagoa, no retorno a Parnaíba. Segui-o, cada qual em sua motocicleta.

Foi uma verdadeira magia ou encantamento o que senti, quando vi aquelas águas escuras, plúmbeas, como diria um poeta, vertidas aos pés daquelas alvas e altas dunas. Nessa época, só existia uma única e rústica churrascaria, quase uma palhoça, se não me falha a memória. Portanto, não existiam a churrascaria sofisticada e nem as edificações do SESI, e quase não havia casas no entorno, nem perto da estrada que a liga à BR. Nessa ocasião a natureza foi pródiga, e nos deu um caprichoso espetáculo. Quando chegamos, o sol estava esfuziante, a iluminar as dunas e as águas de chumbo da lagoa, provocando cintilações e sobretons. Mas logo começou a cair uma mansa chuva; o tempo esfriou de repente e escureceu, com o Sol obnubilado pelas nuvens prenhes d'água, cujas gotas despencavam sobre nós e sobre a terra, como uma bênção palpável de Deus.

Lagoa do Portinho
Mas logo fez sol novamente, e a lagoa e as dunas voltaram a brilhar intensamente, na glória e no fulgor de sua beleza. Como disse, a natureza estava pródiga em seus surpreendentes caprichos, e mais uma vez choveu, para depois fazer sol mais uma vez. Estava a uma mesa, perto de nós, uma graciosa moça, no esplendor de sua formosura. Não era uma beleza longilínea, magérrima, como a das modelos de hoje, mas uma beleza mais arredondada, generosa, exuberante, aliciante, alourada, cheia de sinuosidades feminis, de muitos acidentes e recortes geomágicos/anatômicos. Seus olhos agateados, com a mudança de luminosidade, pareciam furta-cores, e eu nunca soube ao certo se eram mesmo verdes ou azuis, ou se eram um misto dessas duas cores. Apenas lhe admirei a beleza à distância, posto que não a conhecia, e a considerei parte integrante da magia e alumbramento da Lagoa do Portinho. Um poema a retratar essa tarde encantadora ficou a borbulhar e a marulhar em meu cérebro, durante anos, mas só fui escrevê-lo mais de duas décadas depois, sob o título de Mulher na Lagoa do Portinho.



Hoje, para minha tristeza e consternação, constato que a lagoa está degradada. As dunas, que nunca passaram por um processo sério de contenção, assorearam o manancial de tal forma que um homem, em certas épocas do ano, pode atravessá-lo a pé, quando as águas outrora eram profundas. Por outro lado, as construções em suas margens, aos poucos, vão lhe roubando a beleza bucólica e selvagem, dos tempos em que a conheci, quase intocada, ainda no apogeu de sua beleza luxuriante. Ainda vislumbrei o que restava do antigo bosque, apenas uma pequena nesga de mato, cujas folhas acenavam ao longe, como um lenço verde da esperança, e algumas reses, que vieram matar a sede, e me fizeram retornar ao bucolismo dos tempos de minha juventude.

Dizem, mas não sei ao certo se a afirmativa é verdadeira, que o bombeamento de água para os criatórios de camarão também contribuem para a degradação ambiental da lagoa. Por outro lado, uma placa exibe o triste aviso de que a lagoa contém piranha, peixe voraz, de mordida mutilante, quando em tempos idos podíamos mergulhar em suas águas sem nenhum temor, exceto o desvanecedor e mítico receio/anseio de sermos atraídos e fisgados por alguma sereia forasteira ou nativa mãe-d'água ou iara, que nos levasse para seu reino encantado, para habitar seu castelo nas profundezas das águas plúmbeas da lagoa.


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Por Elmar Carvalho/Blog Literário/180graus
Edição: Wagner Roberto

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