Ainda está levantado fumaça e fedendo a palha queimada o ocorrido do final de semana dentro de uma delegacia policial de Parnaíba quando o cinegrafista Juciê Machado, da TV Costa Norte foi impedido, teve seu equipamento de trabalho apreendido e ficou detido por estar registrando uma ocorrência de grande repercussão. Eu não vou pormenorizar o crime e o que era porque isto é menos importante neste momento.
Particularmente eu como jornalista nunca fui de andar em porta de delegacia atrás de ver como a polícia trabalha em investigações desse ou daquele crime. Eu sempre acreditei e ainda acredito que a relevância que a imprensa deve dar ao trabalho policial deve ter acima de tudo um critério de racionalidade. Acontece que o repórter sempre está em busca da novidade e da exclusividade e esquece que tem um compromisso de respeito por ele mesmo.
Sempre achei e ainda acho a relação de alguns policiais, civis ou militares, muito falsa com a imprensa. É a velha e conhecida história da amizade do cão com o gato. O primeiro usa a força e a autoridade para intimidar. O segundo usa a astúcia para retirar do primeiro tudo aquilo de que necessita. Um fica sempre devendo ao outro. Podem o cão e o gato comer a mesma ração, dormir longos e bons sonos no mesmo canto da sala e até brincarem juntos. Mas tem sempre aquela hora em que um dos dois não está para brincadeiras e os dois acabam se estranhando.
Eu me lembro de um livro que escrevi há uns cinco anos, uma fábula, A Grande Festa dos Bichos, sobre esta estranha e nem sempre fiel amizade entre eles. Alguns são interessantes pela forma como vivem e se comunicam. Outros são mais exóticos e até vaidosos quando estão de posse de um território. Essa questão da vaidade está em todas as profissões. Médicos são vaidosos. Políticos são vaidosos. Cientistas e artistas são extremamente vaidosos. Quem é que não gosta de aparecer na mídia ostentando um feito? E o repórter faz o papel do gato. Tem seus recursos para tirar o máximo de proveito desse ou daquele ocorrido.
Esta relação delicada e nem sempre fiel entre policiais e repórteres leva certamente a um desgaste das duas partes. Puída feito corda de puxar balde. Pelo lado da polícia, o de sempre quando quer projeção corre em busca de quem detém a mídia e usando o princípio da intimidação sutil. É bonito e dá orgulho se mostrar na televisão, nos blogs e portais ostentando equipamentos e autoridade. É relevante aparecer de vez em quando em eventos abraçados com repórteres e se dizendo amigos.
Pelo lado do repórter porque se deixa ser refém da autoridade policial e daquilo que ela está fazendo. Ocorrências policiais são matérias de consumo barato e tem todo dia na banca da feira. Essa situação cria nele repórter e no seu trabalho final uma dependência, quase química em somente cobrir a atuação nos plantões de delegacias. E a gente está cansado de ver muito repórter abraçado com trincas de policiais, sejam civis ou militares, se dizendo até compadres. Com todo o respeito, cães e gatos vão ser eternamente animais diferentes.
Pádua Marques, jornalista e escritor.
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